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Covid-19: vacina da UFMG e Fiocruz está pronta para testes em humanos

Concebida como dose de reforço, a SpiN-Tec induziu a resposta imunológica contra o Sars-CoV-2 e as variantes delta e ômicron. Ensaio clínico deve começar este ano

Paloma Oliveto

postado em 31/08/2022 06:09

 (crédito: CTVacinas/UFMG/Divulgação)

(crédito: CTVacinas/UFMG/Divulgação)

Cem por cento nacional, uma vacina de reforço para covid-19 está pronta para ser testada em humanos. Idealizada pelo Centro de Tecnologia de Vacinas da Universidade Federal de Minas Gerais (CTVacinas-UFMG) em parceria com a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), a substância é inovadora ao ter como alvo uma proteína do vírus diferente da mirada pelos demais imunizantes que combatem o Sars-CoV-2. Em um artigo publicado na revista Nature Communications, os autores do estudo relataram que a chamada SpiN-Tec induz uma resposta robusta do sistema imunológico contra as variantes delta e ômicron, além da cepa original.

“Estamos com uma expectativa muito positiva, várias pessoas já se candidataram para os testes, entusiasmadas por ser uma vacina brasileira”, conta Ricardo Gazzinelli, coordenador do CTVacinas e pesquisador da Fiocruz. “No minuto seguinte que a Anvisa aprovar os testes, vamos entrar com uma grande divulgação”, diz. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária precisa dar o aval para ensaios realizados com humanos, assim como a Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep), que já autorizou o experimento. Gazzinelli diz que a documentação já está toda com o órgão, e os experimentos devem começar ainda este ano. 

Na primeira fase dos testes, serão 80 voluntários de 20 a 59 anos. Em seguida, entrarão mais 400 pessoas acima de 59. Em todos os casos, os participantes têm de esperar mais de seis meses depois de ter sido vacinado para covid-19; não importando qual imunizante anterior foi utilizado. No ensaio clínico, porém, os voluntários terão sido vacinados inicialmente com a substância da Astrazeneca. 

Gazzinelli explica que desde o início das pesquisas com a SpiN-Tec, o objetivo dos cientistas era chegar a uma vacina de reforço. “Já antecipamos que, quando chegasse a fase dos testes em humanos, grande parte da população estaria vacinada, o que seria uma dificuldade”, diz. Além de ser idealizada e produzida no Brasil, a SpiN-Tec tem como diferencial a fusão de duas proteínas do coronavírus, para estimular a resposta imunológica. Além da spike, utilizada pelo Sars-CoV-2, a vacina é composta pelo nucleocapsídeo, a estrutura que abriga o material genético viral.

Combinação 

A combinação das proteínas deu origem a uma molécula que, no organismo, estimula a produção de linfócitos T, células do sistema de defesa especializadas em reconhecer o Sars-CoV-2 e destruí-lo. Um problema das vacinas atuais são as mutações na spike, que dificultam a detecção do vírus e, consequentemente, reduzem a eficácia das substâncias. Segundo Gazzinelli, o nucleocapsídeo é muito mais estável e, por isso, menos sujeito a variações. No estudo, a SpiN-Tec mostrou a mesma eficácia contra as variantes delta e ômicron que a verificada na cepa original, a Wuhan.

Sozinha, a vacina brasileira não induz a formação de anticorpos. Porém, como dose de reforço, a substância estimula a imunidade celular — resposta das células T e auxiliares — e a humoral, que produz as imunoglobulinas específicas. Assim, a SpiN-Tec acaba atuando em duas frentes.

No artigo publicado na Nature Communications, os autores relatam o resultado dos estudos em camundongos, realizados em um laboratório da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da USP (FMPR-USP) com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). Os animais foram modificados geneticamente para expressar a proteína ACE2 que, em humanos, é utilizada pela spike do Sars-CoV-2 para entrar nas células e, assim, começar o ciclo de replicação. As cobaias também foram alteradas de forma a mimetizar a covid grave.

Os animais foram divididos em grupos: uma parte recebeu duas doses da SpiN-Tec com intervalo de 21 dias entre elas. Nos demais, os cientistas ministraram placebo. Passado um mês, os camundongos foram expostos por via intranasal a uma alta carga do Sars-CoV-2, tanto na versão original quanto nas variantes beta, delta e ômicron. 

Proteção 

“No grupo que recebeu placebo, 100% dos animais infectados com a cepa de Wuhan ou com a delta morreram”, contou à Agência Fapesp Juliana Castro, doutoranda orientada por Gazzinelli que realizou os testes pré-clínicos. “Já os camundongos expostos à ômicron não evoluíram para óbito, mas desenvolveram uma patologia significativa no pulmão. No grupo dos imunizados, todos os animais sobreviveram às três cepas e o tecido pulmonar estava muito mais preservado. Além disso, observamos uma redução na carga viral que variou entre 50 e 100 vezes.”

Em um modelo de hamsters que mimetizaram a covid-19 moderada, a vacina foi testada contra a variante original e a delta, também com sucesso. Os animais imunizados apresentaram uma carga viral 10 vezes inferior, além de menos danos pulmonares, comparados aos do grupo placebo. A substância também foi testada em coelhos e com sangue de convalescentes (pessoas que se recuperaram da covid-19), com a mesma eficácia. 

Segundo Natália Salazar, pesquisadora do CTVacinas, a tecnologia utilizada na SpiN-Tec — a combinação da proteína recombinante com um adjuvante, que potencializa a resposta imune — é baseada na modificação genética da bactéria E.coli, que recebeu pedaços do genoma do Sars-CoV-2, produzindo, assim, a spike e o nucleocapsídeo. Ela explica que o método poderá ser utilizado em outras doenças. “Antes da pandemia, já trabalhávamos com essa tecnologia aplicada a doenças como a leishmaniose e chagas. A urgência provocada pelo aparecimento da covid-19 nos ajudou a desenvolver essa solução o mais rapidamente possível”, diz. Atualmente, a CTVacinas pesquisa, também, um imunizante para a monkeypox.

Fonte: Correio Braziliense.

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